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PAOLA D AGOSTINI
( ITÁLIA )
Embaixada de Itália em Lisboa.
Folhinha Poética – 2012:
Novos descobrimentos
Na esquina da mercearia indiana
Reflexas nas montras de porcelana
Entre cartazes de holliwood e latas de coca-cola
Duas velhinhas que parecem saídas de uma cartola
Saias com padrão de toalha de piquenique
Conversam animadamente, juro, sobre o Titanic.
— Já viu, minha senhora?
Aquilo afundou-se mesmo.
— Pois é, vizinha, muito embora
Há quem goste de mergulhar no abismo.
São oito da manhã, ando apressada
Mas a conversa deixa-me pasmada.
Terá havido algum naufrágio recente?
Terei acordado mesmo hoje, data e hora,
corretamente?
Só me apetece rir, não acredito
Desço a calçada mais surreal do mundo e lá oiço um
grito
Na minha língua, ainda por cima, tão ruidosa
Que se ouve do Panteão à Rua da Rosa.
São os simpáticos passageiros
Do mastodôntico cruzeiro
Ancorado no Cais do Sapato
Desde o domingo passado.
— Ao´, famo npo´de bunga, adi, che c´ho´e voje?
Sta zitto, a Ni, que le sente mi moje...
— Bunga bunga é o quê? — Pergunta-me com ar de
marciano
O arrumador, que até se gaba de falar italiano.
Olhe, para lhe dar uma ideia
É um “ritual erótico pós-ceia”
Quem em Itália virou prática política.
E esgotou os argumentos da ética.
É assim: pega numa miúda, menor de idade,
possivelmente
Mas altiva, com ar de executiva, tipo uma Lewinsky
Dás-lhe com brilhantes Swarowskij
Rigorosamente em forma de borboleta
E pedes à charmosa
Que arranje uma boa tusa
Para o nosso presidente da treta.
É assim: num país tarado
O sexo é assunto de estado.
Ah é, menina? Também há disso? E tão à vista?
— Pergunta-me acenando a um motorista—
Parece mas é As Mil e Uma Noites...
Infelizmente, são mais que mil e uma, meu amigo
É uma noite infinita, esta que eu digo.
Enfio-ma na boca do metro que é mais um dragão
A engolir-me a raiva e a respiração
E descubro que, vendo bem a situação,
As cotas do Titanic tinham toda a razão.
*
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Página publicada em novembro de 2023
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